Indício de desocupação gera tensão em quilombo, dizem entidades sociais

04/03/2012 23:50

Indício de desocupação gera tensão em quilombo, dizem entidades sociais

Comunidade denuncia presença de caminhões e trator nesta manhã.
Governo federal teria suspenso a retomada da terra que aconteceria hoje.

Tatiana Maria Dourado Do G1 BA

 

A comunidade quilombola 'Rio dos Macacos', localizada no bairro de São Tomé de Paripe, no limite da cidade de Simões Filho Salvador, teme investida de reintegração de posse articulada pela Marinha do Brasil, com apoio de segurança da Polícia Militar, neste domingo (4). De acordo com Vilma Reis, presidente do Conselho de Desenvolvimento da Comunidade Negra da Bahia (CDCN-BA), teriam se aproximado do local três caminhões de fuzileiros, cada um com 80 homens, além de um trator. A Marinha propõe judicialmente a retomada da área à União desde 2009. A assessoria de comunicação da corporação militar disse ao G1 irá enviar uma nota à imprensa sobre o fato quando autorizado.

De acordo com Vilma Reis, a ação de reintegração de posse do território tinha execução marcada para este domingo, mas o governo federal determinou a suspensão da tomada do território. "Foi entendido que a comunidade não foi defendida e que a Justiça Federal agiu em um único polo, para beneficiar somente a Marinha, que tratou os quilombolas como invasores, alegando que eles estão lá há cerca de três, quatro anos. A Polícia Federal não pode nem entrar na área, por ordem presidencial. Essa população reside na comunidade, que era uma fazenda, há 238 anos. Não queremos assistir a um outro 'Pinherinho' no Brasil", afirma a presidente do movimento.

Vilma Reis comenta que ali viviam outras 52 famílias, que foram "expulsas" em 1972. "Elas foram expulsas quando a Vila Naval foi construída, mas até hoje estão encostadas no muro, porque nunca perderam o vínculo com a comunidade. Tem um garoto que fala que, quando sente saudade do avô, vai em uma daquelas árvores. Isso é uma ação violenta contra a memória ancestral". Ainda segundo ela, a área pertencia à família Martins, que foi dona de grande parte do território da capital e recôncavo baiano. "Com a decadência do açúcar, eles [da família] vão se envolver em outras atividades e os quilombolas permanecem no local. Quando você chega, ainda vê os restos da fazenda, das correntes e de todo o material que servia para a tortura [dos escravos]. O laudo da Marinha mostra totalmente o contrário", comenta Reis.

Um dos integrantes do movimento pró-Rio dos Macacos, Hugo Dantas, 24 anos, afirma que os moradores não irão sair do local. "Imaginamos que isso seja uma ameaça para a desocupação da comunidade, que está aqui há mais de 200 anos. A Marinha chegou depois, há 42 anos. Foram eles, os moradores, que ajudaram a construir a Vila Naval. Eles vivem constrangidos, porque hoje são impedidos de plantar, de colher, de comercializar", comenta ele, que estuda ciências sociais na UFBA. Outros membros de movimentos sociais estão no local e, além de administrar a situação, distribuem alimentos, em uma ação social que já estava programada para ocorrer.